Entrevista: General Akira Obara

9 de setembro de 2022

Este ano, o general Akira Obara, conselheiro da Fundação Instituto Educacional Dona Michie Akama, foi homenageado com duas importantes condecorações. A primeira é a Ordem do Sol Nascente, Raios de Ouro com Roseta. Ela é outorgada pelo governo do Japão a civis e militares por serviços prestados ao país. A segunda é o Título de Cidadão Paulistano, concedido pela Câmara Municipal de São Paulo a pessoas nascidas em outras cidades. 

Filho de imigrantes japoneses que trabalhavam em uma lavoura em Araçatuba, no interior do Estado de São Paulo, foi o único de 12 irmãos que frequentou a escola. Obara foi para a Escola Preparatória de Cadetes e fez carreira no Exército brasileiro: foi chefe da Comissão do Exército em Washington, nos EUA; comandante da 14º Brigada de Infantaria Motorizada em Florianópolis; chefe do Estado-Maior do Comando Militar do Sudoeste; e comandante da Aviação do Exército, em Taubaté. Foi o primeiro nipo-brasileiro a ser nomeado general do Exército Brasileiro (1995). Desde que se aposentou, em 2000, Obara dedica-se ao intercâmbio e ao bom relacionamento Brasil-Japão. 

Representantes da Diretoria Executiva da Fundação Instituto Educacional Dona Michie Akama em solenidade. Da esquerda para a direita: Lauro Hirata (vice-presidente), General Akira Obara (conselheiro), Paulo Guilherme Toledo (presidente) e Carlos Uratani (secretário)

Fundação Akama e Pioneiro
O general conheceu Antonio Akama, filho de Dona Michie Akama, em um evento no Bunkyo (Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa e de Assistência Social). Convidado a visitar o Pioneiro, Obara se identificou com os valores da escola e da Fundação Instituto Educacional Dona Michie Akama, do qual é membro do Conselho até hoje. “Vim [ao Pioneiro] e adorei. Gosto muito de crianças. Sentava com ele [Antônio Akama] e trocávamos ideia”, lembra. “Eu vinha quase todos os dias”.

O general gentilmente conversou com o Pioneiro para falar de sua história de vida. Leia a entrevista completa abaixo.

Pioneiro: O senhor sempre quis seguir a carreira militar?
General Obara:
Não. Na época (final dos anos 1950), havia três opções “clássicas” de carreira: médico, dentista e professor. No entanto, para o imigrante japonês, o importante era ser mão de obra na roça e estudar acabava sendo coisa de “vagabundo”. Nenhum dos meus 11 irmãos e irmãs tiveram formação acadêmica porque não queriam. Mas eu queria estudar.

Depois do ginásio, eu não tinha condições de pagar pelo meu estudo. Alguém me falou de uma escola militar (Escola Preparatório de Cadetes) que, se entrasse, eles custeavam uniforme, comida, estudo e ainda pagavam um dinheiro para a gente se virar. Decidi entrar nessa. 

Pioneiro: Foi muito difícil entrar na escola militar?
General Obara:
Meu pai me trouxe para São Paulo (moravam em Araçatuba) e fiquei numa pensão na rua São Joaquim. Estudava japonês à noite. Meu pai falou que eu precisava trabalhar e fomos procurar um serviço de office boy com um conhecido do meu pai no Banco América do Sul. O diretor falou que era melhor eu não trabalhar, porque iria ganhar dinheiro e parar de estudar. “Faz ele estudar japonês mas mantém ele no cursinho”, foi o conselho que ele deu. Então fiz um ano de cursinho e fui aprovado. 

Pioneiro: E como foi o curso?
General Obara:
No primeiro ano foi muito difícil, existia o tal do trote, que era muito forte. E eu quase não entrei pela minha estatura. No ano seguinte, foi construída em Campinas a Escola Preparatória de Cadetes e fui fazer o segundo ano lá. Ficamos lá por dois anos. 

Em 1960, um episódio marcou a minha vida. Durante um exame médico, um dos médicos viu meus pés e falou “você é inapto porque tem o pé chato”. Mas durante os três anos de escola preparatória, no TAF (Teste de Aptidão Física) sempre tive avaliação excelente em tudo. De repente, eu era inapto por causa do pé chato. Por sorte, um tenente farmacêutico, casado com uma japonesa, fez todo o possível para me colocar num recurso de segundo instância, que seria só no Rio de Janeiro. 

No Rio, o coronel falou pra mim “aqui está escrito que você tem pé chato. Que eu saiba, a maioria dos japoneses têm pé chato. Mas você fez todos os exames até hoje, então vou considerar você apto”. Então deu certo e fui para a Academia Militar de Agulhas Negras com 40 dias de atraso.

Pioneiro: Como o senhor tornou-se general?
General Obara: Fiz todos os cursos do Exército. Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais, curso de Equitação, todos que são requisitos para sair General.

Além disso, conheci alguns generais durante minha carreira no Exército. Fui assistente de general e assessor de dois ministros do Exército. Minha educação, honestidade, dedicação e amor ao trabalho chamaram a atenção deles. Eles confiavam em mim, eu organizava todo o material, cuidava de tudo. 

Além das minhas qualificações e de eu atender aos pré-requisitos, a sugestão de me promoverem a general foi uma forma de demonstrar gratidão ao povo nikkey no Brasil, por tudo o que eles fizeram pelo País. Sou grato e atribuo minha promoção também à comunidade japonesa, à qual tenho me dedicado desde que me aposentei, em 2000. Coordenei a construção do monumento da arquiteta Tomie Ohtake no aeroporto de Guarulhos, por exemplo.

Minha vida sempre foi de ajudar o próximo.

Pioneiro: Quais são seus conselhos para os jovens de hoje?
General Obara: Tenho certos princípios. Existem quatro males na vida do ser humano: ganância, ambição, soberba e inveja. Todas têm a ver com a parte material.

No entanto, há quatro pilares espirituais que devemos seguir sempre: amor, gratidão, justiça e humildade. Amor em tudo o que faz, em relação à família, amigos e trabalho. É fundamental. Gratidão que é reconhecimento, agradecimento. Justiça, que faz as pessoas serem gratas também. E a humildade, que faz a gente crescer.

Para ser bem sucedido é preciso ter curiosidade. Observar. A curiosidade leva à criatividade. Além disso, tem que ter coragem e muita determinação.

São esses valores que eu queria passar para os jovens.

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