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“Não existe sentimento errado”, diz especialista; assista à conversa

22 de abril de 2020

Na última segunda-feira (20), o Centro Educacional Pioneiro promoveu uma roda de conversa sobre o tema “Os sentimentos em época de distanciamento social”. A live foi transmitida pelo canal de Youtube (@centroeducacionalpioneiro) e acompanhada por cerca de 160 pessoas em tempo real. Os convidados foram Fernanda Issa Farhat e Raul Alves de Souza, integrantes do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Moral (Gepem), criado por pesquisadores da Unicamp e da Unesp.

Assista à conversa na íntegra clicando aqui.

A mediação ficou por conta de Mário Fioranelli Neto, coordenador de Humanidades e do projeto de Convivência Ética, do qual Fernanda e Raul são formadores. Desde o início do ano letivo, a disciplina estimula conversas entre os alunos do Fundamental II, por meio de uma aula por semana, para discutirem temas como bullying e cyberbullying, além de ética e respeito. “Nessa idade, os jovens já têm seus conflitos, tanto no ambiente escolar como em casa”, comenta Mário. “Estamos ajudando os alunos a se formarem no processo de reflexão dos desafios que eles já têm e ainda terão.”

Antes de iniciar a conversa, os participantes puderam ver os depoimentos de alguns alunos sobre as aulas de Convivência Ética. Augusto Akira Simões, do 7ºC, disse que as aulas são importantes por dar espaço para debater assuntos que não conseguem debater em outras matérias. “Aprendemos a falar com as outras pessoas mesmo que elas não tenham a mesma opinião que a gente”, falou. Já Alice Sader Biancalana, do 8ºB, comentou que as discussões os tornam cidadãos melhores. Opinião também compartilhada por Beatriz Brito, do 9ºA, que disse que as aulas ajudam-na a conhecer melhor ao outro e a si mesma.

Alice Sader: “Convivência Ética é uma matéria espetacular!”

Raul Alves de Souza
O primeiro a falar foi Raul, mestre e Doutorando em Educação Escolar pela Faculdade de Ciências e Letras da UNESP de Araraquara/SP e graduado em Educação Física pela Escola Superior de Educação Física de Jundiaí/SP. Ele coordena a implantação de projetos antibullying e planos de convivência em redes de escolas públicas e particulares nos estados de São Paulo, Minas Gerais, Santa Catarina e em Brasília (DF).

Raul explicou, primeiramente, que a dificuldade em expressarmos nossos sentimentos deve-se, em parte, por não conseguirmos entendê-los. Desde crianças somos educados a suprimir certos sentimentos, como tristeza ou raiva, com expressões como “não fique assim, é besteira” ou “não fique triste”. É um comportamento que não valida o que sentimos, e ao mesmo tempo apresenta um mundo onde falar de sentimentos transmite fragilidade, o que é visto como fraqueza.

Dessa forma, o primeiro desafio é formatar um ambiente no qual as pessoas, tanto adultos como crianças/jovens, sintam-se à vontade de sentir e expressar o que sentem.

“O sentimento é algo individual, e cada um precisa achar o melhor caminho pelo qual vai trilhar para que consiga lidar com esses sentimentos.”

“Todo sentimento advém de uma necessidade humana. Quando elas não são atendidas, e nesse momento [de confinamento] muitas não são atendidas, elas geram sentimentos desconfortáveis. Medo, pânico, angústia, raiva, insegurança. Muitas vezes não sabemos lidar com eles, muito por conta de como não fomos educados para reconhecê-los e lidar com eles. Somos censurados quando temos medo, angústia etc.”, completa Raul.

Isso faz com que percamos a capacidade de reconhecer nossos próprios sentimentos. Por exemplo, se você tiver que dizer exatamente como se sente agora, provavelmente terá dificuldades de elencar o que sente, o que vai dificultar as ações a serem tomadas para que se sinta melhor. “Reconhecer os sentimentos é tão importante quanto controlar as ações”, explica Raul.

Algo importante que o educador dividiu foi que “não existe sentimento errado. Eles podem ser ruins porque derivam uma ação ruim. Temos controle do que fazemos a partir deles, mas não controlamos o que sentimos. Os sentimentos são ilimitados”.

A questão é se conseguimos expressar nossos sentimentos de forma que o outro, seja ele pai, mãe, filho, esposa, avó, professor, entenda qual a necessidade não atendida. Por isso, o autoconhecimento e o reconhecimento dos sentimentos estão intrinsicamente ligados. Se conseguirmos entender como nos sentimos, maiores as chances de conseguirmos comunicar esse sentimento

Fernanda Issa Farhat
Fernanda, especialista em relações interpessoais na escola e a construção da autonomia moral pela Universidade de Franca, possui graduação em Licenciatura em Pedagogia pelo Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas. Tem experiência em educação infantil e coordenação pedagógica, com ênfase em gestão escolar. Atualmente atua com formação de professores em redes públicas e privadas nos estados de São Paulo e Minas Gerais.

Ela falou sobre técnicas de linguagem para tornar a comunicação mais assertiva e empática. “Nossa linguagem não é inofensiva, ela afeta a vida das pessoas para o bem ou para o mal. Uma coisa é o que se quer dizer e outra é o que o receptor entende”, explica.

Fernanda citou dois tipos de linguagem: a valorativa e a descritiva.

Linguagem valorativa é a que emite um juízo de valor. “Você é muito preguiçoso”, ou “você sempre faz isso”, por exemplo. É uma fala que culpabiliza e pode humilhar, gerando no outro a necessidade de se defender e valoriza o comportamento que se deseja corrigir.

“A forma como pais e professores falam com uma criança ensina a ela como os outros se sentem a respeito dela e afeta a noção de valor pessoal. As opiniões das pessoas significativas para esse sujeito (no caso, a criança) é a imagem que ele tem de si mesmo, porque ele não tem capacidade cognitiva de separar a imagem que os outros fazem dele da imagem que ele tem de si. É importante para a construção de autoestima”, conclui Fernanda.

E como trocar a linguagem valorativa por algo mais empático? Utilizando a linguagem descritiva, que é a descrição da situação, não da personalidade. Por exemplo, “seu quarto está muito bagunçado” ou “é preciso fazer as tarefas”. Sem julgar. “Quando a gente não rotula, permitimos que nossos filhos possam ser tudo o que eles quiserem vir a ser”, enfatiza Fernanda.

“Crianças pensam diferente, mas sentem igual aos adultos”

Segundo a formadora, podemos utilizar duas técnicas para praticar a linguagem descritiva: escuta-ativa e mensagem-eu.

A escuta ativa consiste em ouvir com atenção sem fazer avaliações. Após a fala do outro, é preciso repetir o que foi dito de forma resumida, estimulando a pessoa a continuar exprimindo seu pensamento ou, até, a chegar a uma solução.

Já a mensagem-eu é dizer como você se sente frente a uma situação. Comece sempre a frase com o pronome “eu”. Isso permite que você entenda e classifique seus próprios sentimentos.

“Não existe receita, tudo tem que ser adaptado. Temos que pensar na qualidade da nossa comunicação”, frisa Fernanda.

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