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Artigo: No Dia do Jornalista, seja um também

7 de abril de 2020

Por Naila Okita Shimizu

Hoje, dia 7 de abril, é o Dia do Jornalista. Eu não sou muito de dar atenção a essas “comemorações”, mas o contexto atual me fez refletir sobre essa profissão que eu escolhi para mim há 20 anos.

Na faculdade, ao contrário do que muitos pensam, não tivemos aulas de “como escrever bem”. Tivemos, sim, aulas de cidadania, semiótica, ética, respeito, divulgação científica. Aprendemos a ouvir o outro, a procurar os dois (três, quatro, cinco…) lados de uma mesma história. Tivemos práticas de redação de jornal, revista, rádio e televisão para entendermos as especificidades de cada um. Era preciso entender a diversidade em suas várias expressões.

Passamos uma madrugada em um Pronto Socorro para observar como é um plantão na sala de espera de hospital. Fizemos jornal para a comunidade ao lado do campus, entramos em suas casas, convivemos com as crianças, participamos de seus campeonatos de futebol. Tivemos exercícios de sensibilização.

Uma das lições mais valiosas que aprendi veio em forma de bronca. No primeiro semestre, em um trabalho em grupo relativamente fácil, tínhamos que fazer um relatório sobre um assunto específico ligado a empresas de telefonia móvel. Pesquisamos intensamente, conseguimos relatórios, dados, muitos números e gráficos. Um trabalho recheado de informações, estava ótimo. O professor ouviu nossa apresentação e fez apenas uma pergunta: “mas quem vocês entrevistaram”? Não percebemos que, na ansiedade de buscar qualquer informação que “recheasse” nosso documento, esquecemos do principal, que era falar com alguém. Ouvir. E não só um alguém, mas pelo menos dois ou três profissionais do ramo, para saber as perspectivas deles, de quem entende, trabalha e estuda o assunto. Para o trabalho, buscamos quantidade e não qualidade.

Estudar jornalismo pressupõe uma formação técnica, mas também humana. Logo, não somos perfeitos. Longe disso! Somos bastante diferentes uns dos outros e erramos, como todo mundo. Os veículos de comunicação têm cada qual sua linha editorial e podem, dependendo do ponto de vista, fazer um ou outro recorte da realidade. O que não podem, em hipótese alguma, é mentir. Como em uma argumentação, em que se utilizam informações e fatos para defender uma opinião, assim os jornalistas compõem uma notícia. Por isso é muito importante se informar em diferentes meios, de preferência com linhas editoriais distintas, para ter uma noção melhor do todo e tirar suas próprias conclusões.

No entanto, de uns anos para cá, o jornalismo luta contra um fenômeno chamado fake news, ou notícias falsas. O nome já diz tudo, são mentiras em formato de notícias. Em um primeiro momento, pode parecer estranho que alguém acredite em uma notícia falsa, afinal, quem acredita e passa adiante uma mentira como se fosse verdade? Mesmo assim, as fake news tornaram-se parte da disseminação de (des)informações no mundo todo.

Elas começaram disfarçadas de notícia, com layout, formato, e às vezes até link parecido ao de um portal jornalístico. Para enganar mesmo. Com o tempo, percebeu-se que não era preciso tanto cuidado. Bastava uma mensagem alarmista, mesmo que mal redigida ou desrespeitosa, ou um áudio de procedência desconhecida. As pessoas acreditavam em “qualquer coisa”.

Isso pode servir de objeto para estudos em áreas como antropologia, sociologia, educação, linguística etc. Mas quero destacar aqui uma consequência um tanto irônica: o fenômeno gerou um movimento de desconfiança justamente em relação ao jornalismo profissional. Ou seja, as fake news conseguiram um público cativo que vê nelas a verdade e, no jornalismo profissional, a mentira.

Mas por quê?

Em parte, porque nós gostamos muito da nossa “bolha”. Quando confrontados com um ponto de vista diferente, nossa primeira reação é rechaçar o que vai contra nossas crenças. E as notícias falsas têm grande apelo exatamente porque dizem o que queremos ouvir, por isso é mais fácil acreditar nelas – porque queremos acreditar nelas.

Lembre-se de que um bom jornalismo não é aquele que fala o que você quer ouvir, mas sim aquele que fornece informações para que você possa refletir sobre um assunto. A notícia não é falsa só porque você não gosta do que ela diz.

No Dia do Jornalismo, eu agradeço aos meus colegas que seguem apurando, investigando, divulgando e levando adiante tudo aquilo que aprendemos na faculdade. E desejo que todos, independentemente da profissão, sejam um pouco jornalistas no seu cotidiano. Complementem suas opiniões com outros pontos de vista, estejam abertos a ouvir, dialogar, criticar, duvidar, ponderar. Sejam humildes. Se não entenderem sobre um assunto, pesquisem. Se acharem que sabem muito sobre algo, duvidem de si mesmos e pesquisem mais ainda.

Um colega meu escreveu que não adianta culpar as redes sociais pela disseminação de fake news. Um dos desafios do jornalismo profissional é como chegar antes nessas pessoas que se informam por WhatsApp, e concordo com ele. A tecnologia nos impôs uma série de desafios – e possibilidades – na busca por informação confiável. Não temos as respostas, mas posso dar uma dica: desapegue-se de suas certezas.

Naila Okita Shimizu foi editora da Revista de Cinema e da editoria de Variedades do Portal Terra, e freelancer das revistas Exame e Super Interessante. Hoje, integra a equipe de Comunicação e Marketing do Centro Educacional Pioneiro.

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